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Microsoft, Apple, Amazon, Facebook e Google: a investida das Big Techs na Saúde


MIT Tecnology Review Brasil - 25/06/21


As gigantes de tecnologia estão em busca de um espaço na área de saúde. Mas o que esperar de cada uma delas nos próximos anos e o que elas podem contribuir para tornar nossas vidas, como pacientes, melhores?

 

O último evento da Apple, o WWDC trouxe mais uma vez à tona o interesse de uma gigante de tecnologia no setor de saúde. A cada ano novidades surgem no evento da Apple trazendo de novos hardwares para monitorar dados de saúde, até atualizações no aplicativo saúde e no HealthKit, com melhorias para integração de terceiros ou novas formas de compartilhamento de dados com usuários.


Bem, todas as BigTechs estão no páreo, com diferentes abordagens, é verdade, porém com um mesmo objetivo, abocanhar uma parcela de um gigantesco mercado e que só nos Estados Unidos, representa 18% do PIB, a saúde.


E não é a primeira vez que as gigantes do Vale do Silício tentam entrar no mercado de healthtechs com seus produtos. Os exemplos mais famosos, e fracassados, diga-se de passagem, foram do Google com o Google Health (que iniciou em 2006 e foi descontinuado em 2012) e da Microsoft com o HealthVault (2007-2019), ambos com a proposta de permitir que as pessoas guardassem e gerenciassem informações médicas em um só lugar.


Claro que o momento agora é outro e que tais iniciativas talvez estivessem muito à frente do seu tempo, pois agora os dados de saúde estão cada vez mais fáceis de serem captados e armazenados, usuários estão mais preparados, e até mesmo nossos smartphones podem ser considerados dispositivos de saúde.


Mais do que nunca é interessante entendermos as diferentes estratégias que cada uma delas busca para atuar nesse mercado.


Apple: privacidade e controle dos dados pelos pacientes

A Apple investe cada vez mais no discurso de segurança e privacidade e na área de saúde não seria diferente. Ela pauta sua estratégia em colocar o usuário no centro de suas decisões, permitindo controle completo do que e quando compartilhar dados com terceiros. Inclusive esse foi um dos pontos que chamou mais atenção no último evento da empresa, a possibilidade de integração com softwares de prontuário eletrônico, porém fornecendo ao usuário sempre a escolha do que compartilhar.


Infelizmente essas novas iniciativas ainda estão muito focadas no mercado americano, sendo que os softwares indicados pela empresa, são majoritariamente utilizados nos Estados Unidos, porém raramente em outros países. Além disso, em sua grande maioria são sistemas destinados a grandes hospitais, deixando de lado a maioria dos profissionais de saúde que atendem a população em geral no dia a dia.


A empresa de Cupertino lançou também novos gráficos de tendência para trazer insights para os usuários sobre mudanças em seus indicadores de saúde, como sono, passos e glicemia, uma iniciativa interessante, visto que com um vasto volume de dados comportados pelo aplicativo Saúde, o desafio passa agora a interpretação dos mesmos pelo público mais leigo.

Sobre o futuro, existe uma imensa expectativa que as novas gerações de dispositivos, como o Apple Watch, tragam também tecnologias para medição de temperatura e glicemia. Essa segunda funcionalidade, em especial, traz consigo um potencial gigantesco, ao trazer uma nova forma de medição de forma não-invasiva, o que pode extinguir rapidamente métodos tradicionais, como o da medição da glicemia no sangue através de um pequeno furo em um dos dedos. Fora o imenso mercado endereçável, segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, cerca de 12 milhões de brasileiros convivem com a diabetes, já imaginou em um contexto global?


Microsoft: IA e serviços na nuvem customizados para organizações de saúde

A Microsoft foi às compras e investiu pesado nesse mercado com a compra da Nuance por quase 20 bilhões de dólares. Com essa movimentação, ela se aproxima ainda mais dos softwares de prontuário eletrônico (EHR) do mercado e também de operadoras de saúde e hospitais. Diferente de sua primeira tentativa no mercado de saúde com a HealthVault tentando atingir diretamente o consumidor final, agora a proposta é outra, foco em clientes enterprise.


Google: apoio a profissionais de saúde e navegação no sistema de saúde

Dentre as gigantes de tecnologia, o Google é a com mais diversidade em suas iniciativas, atuando desde a parte de estudos e pesquisas para cientistas e profissionais de saúde com o Health Research, passando também por iniciativas para determinadas doenças e profissionais de saúde.

Organização de dados de saúde para profissionais: é inegável que o Google sabe organizar informações, não é verdade? E esse é o objetivo de um de seus principais projetos na área de saúde, como conectar diferentes fontes de dados e transformar esses dados em informações acessíveis e organizadas, auxiliando profissionais na tomada de decisões médicas. O desafio está na interoperabilidade entre sistemas e em como fazer com que essas iniciativas ganhem escala, afinal os primeiros experimentos da empresa seguem com poucas clínicas, hospitais e softwares de prontuário parceiros.


Ajudar pacientes a navegarem no sistema de saúde: desenvolvimento de ferramentas que auxiliem e guiem pacientes em suas dúvidas de saúde. No passado a empresa trabalhou, por exemplo, com o Hospital Albert Einstein na produção de conteúdos sobre algumas doenças e sintomas, e que eram apresentados para os usuários quando realizavam pesquisas com determinadas palavras-chave. E a linha é exatamente essa, porém agora também com questionários mais completos e que possam se aprofundar no que o usuário precisa.


A empresa também já promove conteúdos de saúde de terceiros de maneira diferenciada, categorizando-os em YMYL (Your Money or Your Life), uma categoria especial de sites e conteúdos que possuem mais rigor na hora do ranqueamento nas pesquisas do Google, levando em consideração três fatores: perícia, autoridade e credibilidade. Assim segue oferecendo conteúdos de terceiros em seu mecanismo de busca, mas trazendo mais rigor para evitar priorizar conteúdos que não tenham o crivo de profissionais ou organizações de saúde. Bons exemplos de sites que seguem essa categoria no Brasil são a Doctoralia e o Portal Minha Vida.


Facebook: uso da saúde para engajamento em suas redes sociais

Existem relatos que a empresa está testando wearables com foco em dados de saúde e que o plano é lançar algo nessa linha em 2022. Outros relatos também afirmam que a empresa usará a base de bilhões de usuários para fornecer funcionalidades baseadas em notificações e lembretes de saúde, como forma de ajudar no engajamento dos usuários em suas plataformas. E a empresa já testou esse conceito de lembretes em alguns países, confira no exemplo abaixo:

Claro que com as especulações, também cresce o receio sobre o uso desses dados para outros fins, como segmentação de usuários e propagandas com base em tais informações.


Sonho VS Realidade

De maneira geral, vejo o futuro com bons olhos em relação ao ingresso dessas empresas no setor de saúde, em especial por dois fatores:


Briga a favor da interoperabilidade: os grandes softwares do mercado, em especial os mais antigos, tendem a ser contra tais iniciativas pois trazem facilidade para que seus clientes migrem de software, representando um risco para seus negócios. Google, Apple, Amazon e Microsoft já demonstraram interesse nessa briga para tornar os dados mais acessíveis e conectados entre sistemas, justificando que essa mudança é necessária para conectar os diferentes players da saúde e que tais ações beneficiarão os pacientes.


Tornar pesquisas e novas tecnologias mais acessíveis: muitas tecnologias que Google e Apple estão investigando ainda não estão prontas para o uso e podem representar anos e milhões de dólares em investimentos antes de partirem para o mercado. Porém, como dinheiro não é problema, podem se dar ao luxo de investir em tais tecnologias e realizar testes em menor escala em parceria com grandes instituições, como Stanford, Mayo Clinic, etc.


Porém, por outro lado, não acredito que essas empresas resolverão tudo sozinhas. A tecnologia, por exemplo, precisa ganhar escala, e o trabalho apenas com clientes enterprises ou parcerias com instituições referências, atinge uma fatia muito pequena da população. Afinal, quantas pessoas têm a oportunidade de realizar uma consulta no Hospital Albert Einstein ou no Sirio Libanês no Brasil, não é mesmo? O futuro está em parcerias com startups que estejam apoiando pequenas clínicas e médicos individuais, pois essas estratégias sim poderão trazer capilaridade na difusão de novas tecnologias, do contrário serão apenas tecnologias caras e utilizadas em pequena escala em hospitais de referência pelo mundo, mais como ações de marketing do que propriamente para melhorar a vida de pacientes e profissionais de saúde.


Este artigo foi produzido por Gustavo Comitre, Product Manager na DocPlanner e colunista da MIT Technology Review Brasil.







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